Despacho de 26 de março de 2018
(DOU de 29/03/2018)

O MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO – SUBSTITUTO, no uso de suas atribuições legais, resolve acolher o opinativo da Assessoria Especial de Apoio ao Ministro exarado na Nota Técnica nº 21/2018/CGAT/AESAM para conceder força executória ao Parecer Jurídico 00002/2018/CONJURMTB/CGU/AGU referente à aplicabilidade da Lei nº 13.467, de 14 de julho de 2017.

HELTON YOMURA

ANEXO

PARECER Nº 00002/2018/CONJUR-MTB/CGU/AGU
NUP: 46010.001823/2017-91
INTERESSADOS: GABINETE DO MINISTRO/MTE
ASSUNTOS: NORMAS E RITOS DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS, CÍVEIS E PENAIS
EMENTA: I. Consulta Jurídica. II. Interpretação de dispositivo da Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017. III. Teletrabalho. IV. Jornada de trabalho. V. Opinião pela exclusão do regime de jornada de trabalho, desde que não haja controle de horário.

I – RELATÓRIO
Por intermédio da NOTA TÉCNICA/GM N. 121/2017 o Gabinete do Ministro solicita a esta Consultoria Jurídica análise e manifestação acerca de questionamento específico sobre a aplicação de dispositivo da Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, a saber:
Considerando o disposto no art. 62, III da Lei 13.467/2017, pode-se afirmar que os teletrabalhadores encontram-se excluídos da proteção da jornada, bem como dos demais direitos provenientes do Título II da CLT, tais como, adicional noturno, horas extras ou qualquer outro que seja auferido por meio de controle da jornada de trabalho?
É o breve relatório.

II – DA ANÁLISE DA CONSULTA
a) Da regulamentação do teletrabalho
Incluídos na CLT pela Lei n° 13.467, de 2017, os arts. 75-A ao 75-E previram a prestação do trabalho remoto.
O art. 75-A estabeleceu que a prestação de serviços pelo empregado em regime de teletrabalho observará o disposto neste Capítulo (II-A).
Segundo o art. 75-B considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.
Para o seu parágrafo único, o comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho.
A Lei n° 13.467, de 2017, de outra parte, também introduziu dispositivo específico do teletrabalho em Capítulo relacionado à duração do trabalho.
Com a inserção desse dispositivo os empregados que trabalham em regime de teletrabalho foram incluídos no rol do art. 62, que trata dos trabalhadores não abrangidos pelo regime de jornada de trabalho, ao lado dos empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho e dos exercentes de cargos de gestão.
b) Da apreciação específica objeto da consulta
Como ressaltado acima o objeto da presente consulta pode ser resumido na seguinte indagação:
Considerando o disposto no art. 62, III da Lei 13.467/2017, pode-se afirmar que os teletrabalhadores encontram-se excluídos da proteção da jornada, bem como dos demais direitos provenientes do Título II da CLT, tais como, adicional noturno, horas extras ou qualquer outro que seja auferido por meio de controle da jornada de trabalho?
Pois bem, em primeiro lugar, cabe registrar que a indagação é pertinente porquanto, de fato, merece trabalho hermenêutico, já que a leitura isolada do art. 62 pode levar ao aplicador do Direito a interpretação que não reputamos mais correta(1).

Isso porque, como registrado acima, a Lei n° 13.467, de 2017, incluiu os empregados que trabalham em regime de teletrabalho na hipótese em que não se aplica o regime de jornada de trabalho e, como consequência, o controle de horário.
Veja, de início, que, pela leitura do art. 62, é possível verificar que em tese nem precisaria o legislador ter incluído dispositivo específico para os que trabalham em regime de teletrabalho. É que poder-se-ia entender que tais trabalhadores já estariam abrangidos na hipótese do inciso I do art. 62, que se refere aos empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho.
Assim, se o trabalhador exercesse atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, se tal condição fosse anotada na CTPS e no registro de empregados, não estaria abrangido no regime de controle de jornada de trabalho. Ao contrário disso, não cumprindo tais requisitos, estaria abarcado pelo regime.
Ocorre que o art. 75-B previu regra que determina que o teletrabalho não constitui ou se enquadra como trabalho externo.
Isso significa que o teletrabalho não pode ser considerado atividade externa e, portanto, não pode ser abarcado na hipótese prevista no inciso I do art. 62.
Veja-se que o legislador pretendeu prever dispositivo específico aos empregados em regime de teletrabalho ao incluir o inciso III e nele não previu nenhuma condição, como o fez para o inciso I (exercício de atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho; haver anotação na CTPS; e no registro de empregados).
A única condição para ser excluído das regras específicas da jornada de trabalho é ser empregado em regime de teletrabalho.
Com efeito, embora não haja menção na exposição de motivos da MP n. 808, de 2017, parece-nos que a intenção legislativa ao prever a regulamentação do teletrabalho foi no sentido de que o controle dos empregados que se submetem a tal regime perpassa pela sua produtividade e não por sua jornada.
Nesse caso, como regra, o trabalho se mede por produção e não por hora trabalhada ou pelo tempo que o empregado se dedica ao labor.
Isso significa então que a regra que exclui o empregado em regime de teletrabalho do art. 62 é absoluta? Pensamos ser negativa a resposta.
Isso porque apenas em princípio os empregados em regime de teletrabalho estão excluídos da limitação de horas trabalhadas, o que não impede que o empregador fiscalize a jornada do empregado, que pode ser controlada por meios telemáticos pela empresa. Nessa hipótese, caso seja extrapolado o limite dessa jornada, horas extras e consectários podem ser gerados.
Fazendo-se interpretação sistemática, é possível verificar que o art. 6oda CLT é claro ao prever que o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância não se distingue, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
E mais, o seu parágrafo único prevê que os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.
Isso significa dizer que o controle do empregador perante o empregado pode ser aferido por meio de informações computadorizadas e essa fiscalização pode averiguar não apenas a produção mas também o horário de labor do empregado. Esse controle é próprio da subordinação jurídica que o empregado se submete numa relação empregatícia.
Assim, embora o art. 62 da CLT exclua os teletrabalhadores do controle de jornada, se o empregador fiscalizar o horário de trabalho do empregado atrai para si o ônus da observância do inciso XIII do art. 7° da CF que garante aos trabalhadores a duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais.
Trata-se de interpretação da CLT a partir da Constituição Federal, uma vez que o aplicador do direito, ao se deparar com normas que possuam mais de uma interpretação, deverá priorizar aquela interpretação que mais se coadune com o texto constitucional.
Esse exercício hermenêutico se resume na aplicação do método interpretativo da leitura da legislação infraconstitucional em conformidade com a Constituição, de modo que o intérprete adota a interpretação mais favorável à Contituição Federal, considerando-se seus princípios e jurisprudência, sem, contudo, afastar-se da finalidade da lei.
Para este método de interpretação deve haver, além da prevalência da Lei Maior, a conservação da norma, visto que ao adotar a interpretação que vai ao encontro da Constituição propicia-se sua eficácia e evita-se que seja declarada inconstitucional e deixe de ser aplicada.
Por conta disso, pensamos ser plenamente possível a adoção do método hermenêutico da interpretação conforme a Constituição ao presente caso.
Assim, mesmo com a previsão legal de exclusão prevista no art. 62, caso o empregador fiscalize não apenas a produção do telempregado, mas também o seu horário, nada impede que aquele se submeta ao pagamento de horas extras e consectários, forte na Constituição Federal.
Em tempo, quando destacado acima que o intérprete deve adotar a interpretação mais favorável à Constituição Federal considerando-se seus princípios e a jurisprudência, cabe registrar que os Tribunais trabalhistas têm entendido que, nas demais hipóteses do art. 62 da CLT, é possível afastar o normativo e aplicar o limite de jornada. A saber:
RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO – HORAS EXTRAS. MOTORISTA.
ATIVIDADE EXTERNA. CONTROLE DE JORNADA. Para chegar-se à conclusão pretendida pela Reclamada, no sentido de que o Autor não estava sujeito à controle de horário, ter-se-ia, necessariamente, que reexaminar o conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância extraordinária, nos termos da Súmula 126/TST. Consequentemente, não há falar em violação ao art. 62, I, da CLT. Por outro lado, não se verifica a apontada ofensa à literalidade do art. 7º, XXVI, da Constituição Federal, visto que o Regional não negou validade à norma coletiva, mas, apenas verificou que, na prática, havia o efetivo controle de horário por parte da Reclamada, circunstância que autoriza o pagamento de horas extras ao empregado que exerce atividade externa. E também não se constata contrariedade à OJ 332/SBDI-1 do TST, haja vista a existência de outros elementos objetivos que possibilitavam o controle da jornada. Por fim, os arestos colacionados são inservíveis ao fim colimado, nos termos do art. 896, ‘a’, da CLT e da Súmula 296, I, do TST. Recurso de Revista não conhecido. (TST, RR – 250600-66.2009.5.04.0203, 8ª Turma, Relator: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, 25.5.2012)
Desse modo, como regra, encontram-se excluídos da proteção da jornada os teletrabalhadores que não possuem nenhuma forma de controle do tempo de trabalho, ou seja, aqueles empregados que iniciam e terminam suas atividades no horário que bem entenderem, com total liberdade. A cobrança patronal é feita por meio de metas e resultados, sem acompanhar os momentos em que a atividade está efetivamente sendo desempenhada.
Por outro lado, excepcionalmente, os teletrabalhadores que sofrem vigilância dos períodos de conexão informatizada ou telemática, localização física ou qualquer outro meio capaz de controlar o horário do início e término do seu labor diário ou semanal, estão enquadrados na disposição do art. 7°, XIII, da CF/88, possuindo direito à proteção da jornada, inclusive eventuais horas extras.

III – CONCLUSÃO
Pelo exposto, entende-se que, regra geral, os empregados que trabalham em teletrabalho não estão abrangidos pelo regime de jornada de trabalho, estando excluídos da proteção da jornada, bem como dos demais direitos provenientes do Título II da CLT, tais como, adicional noturno, horas extras ou qualquer outro que seja auferido por meio de controle da jornada de trabalho.
No entanto, caso sofram fiscalização dos períodos de conexão telemática, localização física ou qualquer outro meio capaz de controlar o horário do início e término do seu labor diário ou semanal, enquadrar-se-ão na disposição do art. 7° da CF/88 e possuem direito à proteção da jornada, inclusive eventuais horas extras etc.
Restitua-se o presente processo ao Gabinete do Ministro para ciência desse opinativo e providências cabíveis.
À consideração superior.

Brasília, 26 de janeiro de 2018.

ERICO FERRARI NOGUEIRA
Advogado da União