Recomendação OIT n°165
Sobre a Igualdade de Oportunidades e de Tratamento para Homens e Mulheres Trabalhadores: Trabalhadores com Encargos de Família

Observação: essa recomendação não constou na consolidação feita pelo Decreto 10.088, de 2019

A Conferência da Organização Internacional do Trabalho, convocada em Genebra pelo Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho e reunida em sua Sexagésima Sétima Reunião, em 3 de junho de 1981;
Considerando que a Declaração de Filadélfia relativa ás metas e aos objetivos da Organização Internacional do Trabalho reconhece que “todos os seres humanos, independentemente de raça, credo ou sexo, têm o direito de buscar seu bem-estar material e seu desenvolvimento espiritual em condições de liberdade e dignidade, de segurança e de igual oportunidade”;
Considerando os termos da Declaração sobre a Igualdade de Oportunidades e de Tratamento para Mulheres Trabalhadoras e da resolução referente a um plano de ação com vista á promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento para mulheres trabalhadoras, adotada pela Conferência Internacional do Trabalho, em 1975;
Considerando as disposições de convenções e recomendações internacionais do trabalho com o objetivo de assegurara igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores, notadamente a Convenção e a Recomendação sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), de 1958, e a Parte VIII da Recomendação sobre o Desenvolvimento de Recursos Humanos, de 1975;
Considerando que a Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), de 1958, não alude expressamente a distinções baseadas em encargos de família e considerando que normas suplementares se fazem necessárias nesse sentido;
Considerando os termos da Recomendação sobre Emprego (Mulheres com Encargos de Família), de 1965, e considerando as mudanças ocorridas desde a sua adoção;
Considerando que instrumentos sobre a igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres foram também adotados pelas Nações Unidas e outros organismos especializados e, tendo em vista, principalmente, o Parágrafo 14 do Preâmbulo da Convenção das Nações Unidas, de 1979, sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação da Mulher segundo a qual os Estados-membros devem “conscientizar-se da necessidade de mudança no papel tanto do homem como da mulher na sociedade e na família, para se chegar á plena igualdade entre homens e mulheres”;
Reconhecendo que os problemas de trabalhadores com encargos de família são aspectos de problemas mais amplos concernentes á família e á sociedade, que devem ser levados em consideração nas políticas nacionais;
Reconhecendo a necessidade de se estabelecer uma efetiva igualdade de oportunidades e de tratamento entre homens e mulheres trabalhadores com encargos de família e entre estes e outros trabalhadores,
Considerando que muitos dos problemas enfrentados por todos os trabalhadores se agravam no caso de trabalhadores com encargos de família e reconhecendo a necessidade de melhorar suas condições, quer com medidas que atendam ás suas necessidades específicas, quer com medidas destinadas a melhorar as condições dos trabalhadores em geral;
Tendo decidido adotar proposições relativas á igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores: trabalhadores com encargos de família, o que constitui a quinta questão de ordem do dia da reunião;
Tendo determinado que essas proposições se revistam da forma de uma recomendação, adota, neste dia vinte e três de junho de mil e novecentos e oitenta e um, a seguinte Recomendação que pode ser citada como a Recomendação sobre os Trabalhadores com Encargos de Família, de 1981:

I. Definição, Alcance e Meios de Implementação

1.
(1) Esta Recomendação aplica-se a homens e mulheres trabalhadores com responsabilidades com relação a seus filhos dependentes, quando estas responsabilidades restringem a possibilidade de se prepararem para uma atividade econômica e nela ingressar, participar ou progredir.
(2) As disposições desta Recomendação devem ser também aplicadas a homens e mulheres com responsabilidades por outros membros de sua família imediata que precisam de seus cuidados ou apoio, quando estas responsabilidades restringem a possibilidade de se prepararem para uma atividade econômica e nela ingressar, participar ou progredir.
(3) Para os fins desta Recomendação, os termos “filho dependente” e “outro membro da família imediata que precisa de cuidado ou apoio” significam pessoas como tais definidas, em todo país, por um dos meios referidos no Parágrafo 3 desta Recomendação.
(4) Os trabalhadores cobertos nos termos das alíneas (1) e (2) deste Parágrafo serão doravante referidos como “trabalhadores com encargos de família”.

2. Esta Recomendação aplica-se a todos os setores de atividade econômica e a todas as categorias de trabalhadores.

3. As disposições desta Recomendação podem ser aplicadas por leis ou regulamentos, acordos coletivos, normas trabalhistas, laudos arbitrais, decisões judiciais ou por combinação destes instrumentos ou por qualquer outro modo adequado e compatível com a prática e as condições nacionais.

4. As disposições desta Recomendação, se necessário, podem ser aplicadas por etapas, tendo em vista as condições nacionais, desde que essas medidas de implementação, quando tomadas, se apliquem, em qualquer hipótese, a todos os trabalhadores cobertos pelo Parágrafo 1, alínea (1).

5. As organizações de empregadores e de trabalhadores devem ter o direi to de participar, de uma maneira adequada ás condições e á prática nacionais, da concepção e aplicação de medidas destinadas a fazer vigorar as disposições desta Recomendação.

II. Política Nacional

6. Com vista ao estabelecimento de uma efetiva igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores, todo País-membro incluirá, entre os objetivos de sua política nacional, dar condições a pessoas com encargos de família, que estão empregadas ou queiram empregar-se, de exercer o direito de fazê-lo sem estar sujeitas a discriminação e, na medida do possível, sem conflito entre seu emprego e seus encargos de família.

7. No contexto de uma política nacional para promover a igualdade de oportunidades para homens e mulheres trabalhadores, medidas devem ser adotadas e aplicadas com vista a prevenir a discriminação direta ou indireta com base no estado civil ou encargos de família.

8.
(1) Para os fins dos Parágrafos 6 e 7 acima, o termo “discriminação” significa discriminação no emprego ou na ocupação conforme definido pelos Artigos 1° e 5° da Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), de 1958.
(2) Durante um período de transição, não devem ser consideradas como discriminatórias medidas especiais que busquem alcançar a efetiva igualdade entre homens e mulheres trabalhadores.

9. Com vista ao estabelecimento de uma efetiva igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores, devem ser tomadas todas as medidas compatíveis com as condições e as possibilidades nacionais para:
a) dar condições a trabalhadores com encargos de família para exercer seu direito a treinamento profissional e á livre escolha de um emprego;
b) levar em conta suas necessidades nos termos e condições de emprego e de seguridade social;
c) desenvolver ou promover serviços de assistência á família e á criança e outros serviços comunitários, públicos ou privados, que atendam ás suas necessidades.

10. Em todo país, autoridades e órgãos competentes devem tomar medidas adequadas para promover a informação e a educação que gerem uma compreensão pública mais ampla do princípio de igualdade de oportunidades e de tratamento para homens e mulheres trabalhadores e dos problemas de trabalhadores com encargos de família, bem como um clima de opinião que conduza á superação desses problemas.

11. As autoridades e órgãos competentes em todo país devem tomar medidas adequadas para:
a) empreender ou promover, conforme a necessidade, pesquisa sobre os vários aspectos do emprego de trabalhadores com encargos de família, com vista ao fornecimento de informações objetivas sobre as quais possam basear-se políticas e medidas salutares;
b) promover a educação suficiente para estimular a distribuição dos encargos de família entre homens e mulheres e dar condições a trabalhadores com encargos de família de cumprir suas obrigações de emprego e de família.

III. Treinamento e Emprego

12. Devem ser tomadas todas as medidas compatíveis com as condições e as possibilidades nacionais, para dar condições a trabalhadores com encargos de família de se integrarem e permanecerem integrados na força de trabalho, assim como de nela reingressarem após ausência imposta por esses encargos.

13. De acordo com a prática e política nacionais, trabalhadores com encargos de família devem poder dispor de serviços de treinamento profissional e, quando possível, de dispositivos de licença remunerada de educação, para fazer uso desses serviços.

14. Esses serviços, conforme necessário, para dar condições a trabalhadores com encargos de família de ingressar ou reingressar em emprego, devem estar disponíveis na estrutura de serviços existentes para todos os trabalhadores ou, na sua falta, na forma adequada ás condições nacionais; devem incluir, sem ônus para os trabalhadores, serviços de orientação profissional, de aconselhamento, de informação e de classificação, dirigidos por pessoal bem treinado e em condições de atender adequadamente ás especiais necessidades de trabalhadores com encargos de família.

15. Trabalhadores com encargos de família devem gozar da igualdade de oportunidades e de tratamento com outros trabalhadores, com relação á preparação para emprego, ao acesso a emprego, á promoção e estabilidade no emprego.

16. Estado civil, situação familiar ou encargos de família não devem constituir, como tais, razões válidas para negação ou término da relação de emprego.

IV. Termos e Condições de Emprego

17. Devem ser tomadas todas as medidas compatíveis com as condições e as possibilidades nacionais e com os legítimos interesses de outros trabalhadores, para assegurar que as condições de emprego permitam a trabalhadores com encargos de família conciliar seu emprego e esses encargos.

18. Especial atenção deve ser dispensada a medidas gerais para melhoraras condições de trabalho e a qualidade de vida no trabalho, inclusive medidas que visem:
a) reduzir progressivamente a jornada de trabalho e reduzir as horas extraordinárias;
b) adotar mais flexibilidade na organização dos horários de trabalho, dos períodos de repouso e das férias, levando-se em consideração o estágio de desenvolvimento e as peculiares necessidades do país e de diferentes setores de atividade.

19. Sempre que viável e conveniente, as necessidades especiais de trabalhadores, inclusive as decorrentes de encargos de família, devem ser levadas em consideração na programação de turnos e de trabalho noturno.

20. Encargos de família e considerações como o local de trabalho do cônjuge e as possibilidades de educação dos filhos devem ser levados em conta na transferência de trabalhadores de uma localidade para outra.

21.
(1) Com vista á proteção de trabalhadores em tempo parcial, de trabalhadores temporários e de trabalhadores domésticos, muitos dos quais com encargos de família, devem ser adequadamente reguladas e supervisionadas as condições em que são exercidos esses tipos de emprego.
(2) As condições de emprego, inclusive a cobertura da seguridade social, de trabalhadores temporários e em tempo parcial devem ser, tanto quanto possível, equivalentes ás dos trabalhadores permanentes e em tempo integral, respectivamente; nos devidos casos, seus direitos devem ser calculados numa base pro rata.
(3) Aos trabalhadores em tempo parcial deve ser dada a opção de ter ou voltar a ter o emprego em tempo integral na existência de vaga e quando cessadas as circunstâncias que determinaram a atribuição do emprego em tempo parcial.

22.
(1) O pai e a mãe devem ter a possibilidade, num período imediatamente seguinte á licença-maternidade, de obterem licença de afastamento sem perda do emprego e dos direitos dele decorrentes.
(2) A duração do período seguinte á licença-maternidade e a duração e as condições da licença de afastamento a que se refere a alínea (1) deste Parágrafo devem ser determinadas, em cada país, por um dos meios referidos no Parágrafo 3 desta Recomendação.
(3) A licença de afastamento referida na alínea (1) pode ser introduzida gradualmente.

23.
(1) Deve ser possível a um trabalhador, homem ou mulher, com encargos de família relativos a um filho dependente, obter licença de afastamento em caso de doença do dependente.
(2) Deve ser possível a um trabalhador com encargos de família obter licença no caso de doença de outro membro de sua família imediata que requeira seu cuidado ou apoio.
(3) A duração e as condições da licença de afastamento a que se referem as alíneas (1) e (2) deste Parágrafo devem ser determinadas, em cada país, por um dos meios referidos no Parágrafo 3 desta Recomendação.

V. Serviços e Facilidades de Assistência á Infância e á Família

24. Com vista á definição do alcance e da natureza dos serviços e facilidades de assistência á infância e á família, necessários para ajudar os trabalhadores com encargos de família a atender seu emprego e a esses encargos, devem as autoridades competentes, em cooperação com as organizações públicas e privadas interessadas, especialmente organizações de empregadores e de empregados, dentro do alcance de seus recursos para coleta de informações, tomar as medidas que possam ser necessárias e adequadas para:
a) reunir e publicar satisfatórias estatísticas sobre o número de trabalhadores com encargos de família empregados ou em busca de emprego e sobre o número e idade de seus filhos e outros dependentes que requerem cuidado;
b) tomar conhecimento, por meio de levantamentos sistemáticos, conduzidos especialmente nas comunidades locais, das necessidades e preferências de serviços e meios de assistência á infância e á família.

25. As autoridades competentes, em cooperação com as organizações públicas e privadas interessadas, devem tomar providências adequadas para assegurar que os serviços e meios de assistência á infância e á família atendam ás necessidades e ás preferências assim levantadas; para esse fim, levando em consideração as circunstâncias e possibilidades nacionais e locais, devem, em particular:
a) estimular e facilitar o estabelecimento, especialmente em comunidades locais, de planos para o desenvolvimento sistemático de serviços e meios de assistência á infância e á família, e
b) organizar elas próprias ou estimular e viabilizar a prestação de adequados e apropriados serviços e meios de assistência á infância e á família, isentos de despesas ou mediante uma taxa razoável, de acordo com a capacidade de pagamento dos trabalhadores, operados ao longo de linhas flexíveis e atendendo ás necessidades das crianças de diferentes idades, de outros dependentes que requeiram cuidado e de trabalhadores com encargos de família.

26.
(1) Serviços e meios de assistência á infância e á família devem satisfazer as normas baixadas e supervisionadas por autoridades competentes.
(2) Essas normas devem definir o equipamento e as exigências técnicas e higiênicas dos serviços e meios oferecidos e a quantidade e as qualificações do pessoal.
(3) As autoridades competentes devem oferecer ou ajudar a assegurar o oferecimento de adequado treinamento em vários níveis, para o pessoal necessário á direção dos serviços e meios de assistência á infância e á família.

VI. Seguridade Social

27. Benefícios de seguridade social, redução de imposto ou outras medidas apropriadas, compatíveis com a política nacional, se necessário, devem estar ao alcance dos trabalhadores com encargos de família.

28. Durante a licença de afastamento, referida nos Parágrafos 22 e 23, os trabalhadores interessados, em conformidade com as condições e a prática nacionais, devem ser amparados pela seguridade social, por um dos meios referidos no Parágrafo 3 desta Recomendação.

29. Nenhum trabalhador deve ser excluído da cobertura da seguridade social em decorrência da atividade profissional de seu cônjuge e dos direitos a benefícios resultantes dessa atividade.

30.
(1) Os encargos de família de um trabalhador devem constituir elemento a ser levado em consideração para saber se o emprego oferecido é conveniente no sentido de que a opção da oferta possa levar á perda ou á suspensão de um auxílio-desemprego.
(2) Especialmente quando o emprego oferecido envolve mudança para outra localidade, as considerações a serem feitas devem incluir o local de emprego do cônjuge e as possibilidades de educação dos filhos.

31. Na aplicação dos Parágrafos 27 a 30 desta Recomendação, um País-membro, cuja economia estiver insuficientemente desenvolvida, pode levar em conta os recursos nacionais e os planos de seguridade social disponíveis.

VII. Ajuda no Atendimento dos Encargos de Família

32. Autoridades e órgãos competentes em todo país devem promover uma ação pública e privada, como for possível, para aliviar o peso dos encargos de família de trabalhadores.

33. Todas as medidas compatíveis com as condições e as possibilidades nacionais devem ser tomadas para desenvolver serviços de ajuda e assistência familiar, adequadamente regulamentados e supervisionados e que, quando necessários, possam oferecer a trabalhadores com encargos de família, assistência qualificada a preço razoável, de acordo com sua capacidade de pagamento.

34. Considerando que muitas medidas destinadas a melhorar as condições dos trabalhadores em geral podem ter impacto favorável sobre os trabalhadores com encargos de família, autoridades e órgãos competentes de todo país devem promover, como for possível, uma ação pública e privada para a prestação de serviços á comunidade, compatíveis com as necessidades dos trabalhadores, como transporte público, abastecimento de água e de energia na habitação ou perto da habitação dos trabalhadores e habitação funcional para facilitar as tarefas domésticas.

VIII. Efeitos sobre Recomendações Anteriores

35. Esta Recomendação substitui a Recomendação sobre Emprego (Mulheres com Encargos de Família), de 1965.